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Conheça o que é a infância espiritual, o grande segredo de Santa Teresinha do Menino Jesus

Uma notícia de grande alegria

Na noite do nascimento de Cristo, o Anjo enviado por Deus disse aos pastores: Não tenhais medo! Eu vos anuncio uma grande alegria…: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor.

A seguir – prestemos atenção! – o anjo indica como é que Deus vem ao mundo para nos salvar: Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido, envolto em faixas e deitado numa manjedoura (Lc 2, 10-12).

Deus vem salvar-nos fazendo-se homem, tornando-se um de nós. Mas abramos os olhos e contemplemos como é que vem ao nosso encontro: humilde, pequeno, desvalido, sem outra riqueza e poder que o seu amor.

Eu sou o caminho, dirá pouco antes de morrer (Jo 14, 6). Convençamo-nos de que só conseguiremos encontrar Jesus e, com Ele, a salvação, se o procurarmos pelo “seu” caminho: o da humildade, a simplicidade e o amor.

Entende agora por que Jesus insistiu tanto na necessidade de nos fazermos como crianças? Em verdade vos digo,se não vos converterdes e vos tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus (Mt 18, 3).

Várias vezes teve de corrigir as ambições e pretensões de seus discípulos, e o fez repisando que o caminho certo é a infância espiritual: Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele (Mc 10, 15).

Sermos crianças diante de Deus

Em que consiste sermos crianças diante de Deus? Jesus diz bem claramente: Quem se fizer humilde como este menino, esse será o maior no Reino dos Céus (Mt 18, 4).

É uma questão de humildade. Não da falsa humildade, seca e amarga, do adulto frustrado que se acha o pior, o mais desgraçado do mundo. É a simplicidade da criança, que sabe que é “pequena”, inclusive “o menor entre todos”, mas está muitíssimo feliz.

Esse espírito de infância foi, para alguns santos, o cume do espírito de filiação divina, de que falávamos antes. Somos filhos de Deus, sim, mas diante dEle «que é Eterno, tu és uma criança menor do que, diante de ti, um garotinho de dois anos»  (Caminho, n. 860).

Santa Teresinha fez da infância espiritual o roteiro que a levou às maiores alturas da santidade, e difundiu pelo mundo inteiro a beleza desta “pequena via”[1]. Outros santos – como São Josemaria Escrivá –, receberam também de Deus graças extraordinárias  para descobrir e enriquecer esse caminho.

Vejamos alguns dos traços principais do espírito de infância.

•Uma limitação cheia de esperança

A criança sabe, mesmo que não pense nisso, que é constitucionalmente limitada e dependente. Mas essa limitação não é uma deficiência, como pode ser a do adulto aleijado ou a do velho decrépito.

As limitações da criança são “pequenez”, “imperfeição” (ainda não perfeição) cheia de esperança, porque diante dela estão duas coisas:

— Um futuro aberto que lhe sorri. A vida da criança é o prólogo de uma caminhada que a pode levar muito longe e muito alto. Tudo é possível!

— Um amor solícito, que a alimenta, cuida, cura, carrega e que, mesmo quando a corrige, o faz por amor e para que cresça melhor.

Pois bem, assim é Deus conosco, se formos humildes.

— Pense que o orgulho leva os adultos à autossuficiência (“não preciso de ninguém, eu me viro; não me faz falta orientação espiritual, nem formação cristã nem o aprendizado das virtudes, nem que me corrijam…”).

— E quando, abandonados assim a si mesmos, os adultos fracassam, o orgulho leva-os à depressão, à frustração, à tristeza, a reclamar de Deus, da vida e dos outros.

Já imaginou uma criança dizendo: “Eu não preciso de ninguém” e, depois, “Eu sou um fracassado”. Só pensar nisso nos faz rir.

Então, por que não fazemos caso de Nosso Senhor e reconhecemos, com uma humildade simples e esperançada, que precisamos de aprender, de ser orientados por quem tem condições, e também de lutar e de nos arrependermos, sem desanimar … A humildade da infância espiritual leva-nos a fazer isso com simplicidade, sem complicar a vida nem perder a alegria.

• Uma pequenez rodeada de amor

A criança, num ambiente familiar normal, está mergulhada num clima de carinho e solicitude. Sente-se segura, mesmo que se machuque, mesmo que berre e se rebele, mesmo quando esperneia e quer bater na mãe. Nós sabemos o que são as crianças e dizemos: “E daí? Não tem importância. É normal, são criancices”. Ela continuará a ser muito amada, e cuidada, e limpada, e defendida, mesmo que às vezes leve umas palmadinhas nos fundilhos.

Você não percebe que isso é o que faz conosco Deus, nosso Pai, e a nossa Mãe Santa Maria? Contanto – é claro – que procuremos ser humildes como crianças.

O cristão que se empenha em ser humilde sabe que Deus age assim com seus filhos. Veja umas considerações bonitas de São Josemaria:

— «Que as tuas faltas e imperfeições, e mesmo as tuas quedas graves, não te afastem de Deus. – A criança débil, se é sensata, procura estar perto de seu pai» (Caminho, n. 880).

— «Estás cheio de misérias. – Cada dia as vês mais claramente. – Mas não te assustes com elas. – Ele bem sabe que não podes dar mais fruto. – As tuas quedas involuntárias – quedas de criança – fazem com que teu Pai-Deus tenha mais cuidado, e que tua Mãe, Maria, não te largue de sua mão amorosa» (Caminho, n. 884).

— «Na vida interior – na vida espiritual –, a todos nos convém ser como esses pequeninos que parecem de borracha, que até se divertem com os seus tombos, porque logo se põem de pé e continuam com as suas correrias; e porque também não lhes falta – quando necessário – o consolo de seus pais» (Amigos de Deus, 146).

• Uma pequenez poderosa

Nos anos em que se falava muito do “poder jovem”, Carlos Drummond de Andrade publicou uma série de crônicas deliciosas, com o título O poder ultrajovem. Giram à volta do “poder” dos bebês, das criancinhas que têm ter a casa inteira – pais, avós, irmãos, tias…–  dependentes deles, dedicados a eles, sob o “domínio” deles. Têm o que Machado de Assis chamava “a soberania da criança”.

Também nós, se nos esforçarmos por ser humildes como crianças (Mt 18, 4), ganharemos um “poder ultrajovem”. Veja mais umas meditações de São Josemaria:

— «Ser pequeno. As grandes audácias são sempre das crianças. – Quem pede… a lua? – Quem não repara nos perigos, ao tratar de conseguir o seu desejo?» (Caminho, n. 857).

— «Perseverar [na oração]. – Uma criança que bate a uma porta, bate uma e duas vezes, e muitas vezes…, com força e demoradamente, sem se envergonhar! E quem vai abrir, ofendido, é desarmado pela simplicidade da criaturinha inoportuna… – Assim tu com Deus» (Caminho, n. 893).

— E Santa Teresinha: «Eu não me posso apoiar sobre nenhuma das minhas obras para ter confiança. Mas sinto uma paz tão grande por ser absolutamente pobre, por não poder contar com nada fora dele, fora de Deus».

Vamos meditar um pouco mais sobre essa confiança.

• Uma confiança que não pode morrer

Deus, pela boca do profeta Isaías, diz-nos umas palavras comoventes: Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? Mesmo que ela se esquecesse, eu não te esqueceria nunca… Como uma criança que a mãe consola, assim eu vos consolarei… (Is 49, 15 e 66, 13).

Compreende? Aconteça o que acontecer na nossa vida, mesmo que sejamos o mais arrebentado dos filhos pródigos, Deus nos estenderá a mão e Nossa Senhora também (ia dizer que nos levantará com as duas mãos). Assim, feliz, vivia São Paulo: Se Deus é por nós, quem será contra nós? Ele, que não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos dará tudo com ele? (Rm 8, 31-32).

Assim vivia Santa Teresinha que, mesmo nas horas mais duras, dizia que seu caminho era «o da confiança total, o abandono de uma criança que adormece sem medo nos braços do pai. Se a noite mete medo à criancinha e se queixa de que não está vendo o pai que a carrega, o que deve fazer é fechar os olhos e confiar: é o único sacrifício que Deus lhe pede».

Também São Josemaria aconselhava a rezar assim: «Senhor, que pouco valho! … Quantos erros! … Ainda bem, Senhor, que me tens sustentado com a tua mão… Não me largues, não me deixes; trata-me sempre como a um menino. Que eu seja forte, valente, íntegro. Mas ajuda-me como a uma criatura inexperiente. Leva-me pela tua mão, Senhor, e faz com que a tua Mãe esteja sempre a meu lado e me proteja» (É Cristo que passa, n. 15).

E, por fim, a mais feliz de todas as criaturas foi Maria Santíssima, nossa Mãe, que na casa de Isabel louvava a Deus dizendo: A minha alma engrandece o Senhor, e meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador! Por quê tanta alegria? Porque olhou para a pequenez da sua serva!  (Lc 1, 47-48). Não olhou para a grandeza das suas realizações ou dos seus méritos…, mas para a sua humilde pequenez.

Compreendemos agora o que significa a alegria de sermos crianças diante de Deus?

fonte: Aleteia