No primeiro período após a conversão, quando Deus generosamente dá alegrias e consolações espirituais, a pessoa, abrasada pelo amor divino, anseia experimentar esse amor cada vez mais. Constantemente busca novas experiências espirituais. Cai em um estado que São João da Cruz chamou de gula espiritual.

Tempo de “voltar para a Nazaré”

Aparece, então, um grande perigo, a tentação de buscar a si mesmo em experiências pessoais, e não a Deus por Ele mesmo e Sua santa vontade. Para não sucumbir a essa tentação, é necessário uma total obediência ao confessor. Uma pessoa casada que vive com maturidade a vida com Deus não negligencia as obrigações em relação ao cônjuge e aos filhos. Se a situação de “gula espiritual” acontece no seu casamento é, então, o momento de “voltar para Nazaré”. Voltar, para cumprir fielmente os deveres de estado e neles perseverar, por meio da oração cotidiana. Os cônjuges devem, antes de tudo zelar pelo tempo reservado à oração familiar e à oração do casal, e para que essa oração não seja negligenciada. Por isso, é necessário criar um ambiente de silêncio interior e de escuta da voz de Deus em meio às atividades diárias e radicalmente arrancar pela raiz tudo o que perturba e destrói esse ambiente.

Para as pessoas que vivem no sacramento do matrimônio, o serviço de Deus começa em casa. Devemos servi-Lo e fazer a Sua vontade nas tarefas diárias, na educação dos filhos, nas preocupações conjugais, buscando o bem de cada um. Deve ser lembrado que na relação matrimonial é necessário ver a presença sacramental do próprio Jesus, encontrar o canal exclusivo da graça contido na relação conjugal. Esse olhar sobrenatural dirigido ao cônjuge só será possível graças à oração diária perseverante e à pureza de coração.

Devemos aprender com São José e Maria Santíssima a atitude de escuta e total dedicação a Deus, na oração, nos sacramentos e nas tarefas diárias. A atmosfera que reinava na casa da Sagrada Família de Nazaré é um grande mistério que a Igreja revela através de cada matrimônio. Essa atmosfera da casa de Nazaré contém em si uma riqueza de virtudes e de todos os dons do Espírito Santo, mas acima de tudo, o segredo da felicidade vivido na relação conjugal.

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Hoje existe uma necessidade urgente de salvar os casamentos em crise. Rezando fervorosamente em suas intenções, é necessário tomar consciência de que os esposos têm um tesouro inestimável no sacramento do matrimônio. Nele participa o próprio Cristo, constantemente presente na união conjugal. Se os cônjuges apresentarem para Jesus, na oração, todos os problemas que enfrentam, então Jesus os ajudará a resolver e convidará o casal a entrar na escola da Sagrada Família de Nazaré.

Sendo uma criança pequena

Para começar a aprender na escola da Sagrada Família, primeiro é necessário se tornar uma criança pequena, que pouco sabe, mas que está pronta para escutar e aprender, porque é humilde e absorve como uma esponja. Necessitamos aprender a confiar e a entregar tudo a Deus, evitando “toda espécie de mal” (1 Ts 5, 22).

Os santos, tendo como exemplo a Mãe de Deus, aprenderam junto dela a “grande arte de entregar-se confiantemente a Deus”, e assim tornaram-se filhos pequenos de Deus como Ela. Sentimos no coração, embora não compreendemos totalmente, que quando estamos perto dela, Ela faz-nos participantes da sua atitude de confiança filial para com Deus. Assim como diz o provérbio polonês z kim przestajesz, takim się stajesz  que quer dizer: assim com quem permaneces, assim te tornas.

Jesus nos fala sobre a necessidade de voltar a essa atitude: “Se não vos converterdes e não vos tornardes como as crianças, de modo algum entrareis no Reino dos Céus” (Mt 18,3). Maria, sempre em silêncio, escutava a voz de Deus e discernia a Sua vontade. Quando o Anjo veio até ela, ela permaneceu em grande expectativa. Em silêncio escutava a Palavra de Deus, em resposta confiava e acreditava. Hoje, em meio à confusão e diversas ameaças, não há ambiente mais seguro para caminhar com firmeza até a santidade para a qual somos chamados do que o ambiente da casa da Sagrada Família. Na atmosfera da casa de Nazaré entramos através da oração diária, perseverante, do santo rosário.

O silêncio interior, atitude de escuta

Toda a nossa atividade como cristãos consiste em concordar e cooperar com Cristo, a fim de que possamos ser conformados com Ele, a fim de que os nossos pensamentos, sentimentos, disposições, aspirações, sejam os mesmos que os de Jesus (cf. Fl 2, 5; Rm 8, 29). De maneira especial, isso se aplica também à Sua reverência filial para com a Sua Mãe Maria, que para Ele é o que há de mais caro em toda a criação. Podemos adentrar com a imaginação na inefável intimidade do Menino Jesus com Maria, quando ela o carregava em seu ventre. É um grande mistério esta primeira intimidade de Jesus e Maria durante nove meses: união sem palavras, em grande silêncio. O silêncio implica concentrar-se, sobretudo na escuta.

Cada santo, descobrindo a presença de Deus no interior de sua alma, cada vez mais apreciava o valor do silêncio. Irmã Faustina escreveu: “O silêncio é como a espada na luta espiritual; a alma tagarela nunca atingirá a santidade. (…) A alma silenciosa é forte; nenhuma adversidade a prejudicará, se perseverar no silêncio. A alma recolhida é capaz da mais profunda união com Deus, ela vive quase sempre sob a inspiração do Espírito Santo. Deus opera sem obstáculo na alma silenciosa” (Diário, 477). Aqui não se trata apenas do silêncio exterior, mas do silêncio do coração.

Após o nascimento de Jesus, o silêncio de Maria não foi interrompido. Houve novas oportunidades para se comunicar, olhar, tocar, sorrir… Mas tudo era envolvido no silêncio e na escuta contínua. Necessitamos novamente aprender a estar em comunhão com Jesus no silêncio! Por isso, em determinados momentos nos quais estamos em casa, precisamos aprender a desligar o rádio, a televisão e tudo o que perturba o silêncio. Então, nossa casa, com a atmosfera da casa da Sagrada Família de Nazaré, pode ser uma escola na qual aprendemos a silenciosa relação com Jesus por meio de Maria, “que se dedicou com grande assiduidade à contemplação do rosto de Cristo, seu Filho. O olhar de Maria é penetrante, ‘capaz de ler no íntimo de Jesus, a ponto de perceber os seus sentimentos escondidos e adivinhar suas decisões” (João Paulo II, discurso, 1 de março de 2003)

Nessa escola também nos ensina São José. O silêncio de São José foi por São João Paulo II enfatizado com eloquência especial não número 17 da exortação apostólica Redemptoris Custos que a Ele dedicou: “Esse silêncio de José tem uma especial eloquência: graças a tal atitude, pode captar-se perfeitamente a verdade contida no juízo que dele nos dá o Evangelho: o ‘justo’ (Mt 1, 19)”.

 

Texto extraído da Revista Divina Misericórdia – Ed. 042