13 de setembro: Memória de São João Crisóstomo Bispo e Doutor da Igreja – Patrono dos Pregadores
SÃO JOÃO CRISÓSTOMO (ano 344 a 407)
Patriarca de Constantinopla
João, chamado “Boca de Ouro” (grego: Chrysóstomus), foi o prestigiado do Deus “amigo dos homens” que se tornou em Cristo o irmão dos pobres, a testemunha até a morte de uma ética intransigente, do serviço eclesial e social, o admirável liturgo, que deu forma à celebração eucarística da cristandade bizantina (a “Liturgia de São João Crisóstomo” é ainda hoje a liturgia da Igreja Bizantina).
Nasceu em Antioquia de família aristocrática. Órfão de pai muito cedo, foi, segundo uma constelação psicológica bastante freqüente nos homens da igreja, profundamente marcado pela fé materna. Quando completou dezoito anos, sua mãe quis conservá-lo perto de si como “monge domiciliar”. Estudou a Escritura, sob a direção dos mestres da escola de Antioquia que enfatizavam a humanidade concreta de Jesus. Tendo concluído seus estudos, partiu para a montanha, para entregar-se a um monaquismo apaixonado, repleto de total desprezo pelos homens. Depois veio uma terrível crise de consciência: o monaquismo não seria um “santo desvio”? Será melhor conservar-se “puro” nos “altos cumes”, deixando perecer os irmãos? Vem a decisão: Porque o mundo agora é nominalmente cristão, é o mundo que é preciso cristianizar.
Ei-lo em Antioquia, ordenado diácono em 380, sacerdote em 386, tanto exalta, no seu tratado sobre o sacerdócio, o sentido sacrifical desse serviço. Pregando incansavelmente, às vezes durante horas, entre aclamações e aplausos do povo, comentando a escritura, especialmente a Epístola aos Romanos: tudo é graça; “logo nós podemos, se quisermos”. Pregando, pois todo mundo, até o Imperador, é cristão, contra as minorias que se atrasam, corruptoras, pregando principalmente para denunciar superstições, festas profanas e divertimentos imorais, pregando para exaltar, contra o luxo e a ociosidade dos ricos, a comunhão de bens, a libertação dos escravos, o trabalho, fazendo apelo à partilha individual e coletiva (propõe um plano para abolir a miséria na Antioquia), porque “o teu e o meu são palavras vãs”, o que importa é o uso comum a todos. O social para João Crisóstomo é sacramental, por causa do Capítulo 25 de Mateus: o pobre, como o sacerdote, é “outro Cristo”, “o sacramento do altar” deve prolongar-se na rua pelo “sacramento do irmão”. No entanto este asceta, que certamente sonhou em transformar a sociedade inteira num vasto mosteiro, este cantor da virgindade, vai afirmar aos poucos que o matrimônio é o sacramento do amor, que a família é uma “pequena igreja”, que a verdadeira virgindade é a castidade espiritual que pode existir também no amor humano.
Em 397, João é escolhido, contra a sua vontade, como arcebispo da capital (Constantinopla). Em Constantinopla alia-se ao povo, multiplica hospitais e centros de acolhimento, evangeliza os campos e também os godos que se estabeleceram no Império. Combate duramente os hereges, mas recusa o apoio do braço secular. Conclui sua admirável obra “Sobre a incompreensibilidade de Deus”: o Inacessível “desce por amor até nós”; o Filho, imagem invisível de Deus, torna-se visível pela Encarnação. Ver a Deus é encontrar o Cristo e o próximo. João estabelece com clareza o vocabulário da oração e da nepsis, “jejum do espírito”.
Face ao poder, ei-lo principalmente como apóstolo purificador. João quer reformar o alto clero, impedir o bispo de Alexandria de perseguir os monges origenistas (injustamente acusados de hereges), moralizar a corte, principalmente a imperatriz, “esta nova Herodíades”. Seus inimigos se coligam. Sua deposição ilegal em 403 é sem futuro, mas em 404 é exilado na Armênia onde fica três anos em liberdade vigiada.
Descobre a paciência de Jó, o primado do Amor, e que importa menos o inferno do que a perda do Reino da Presença… Descobre que a cruz foi pública e a ressurreição secreta, mas que a verdadeira glória se identifica com a cruz. Entretanto, sua correspondência, o alfuxo de visitantes, entre os quais muitos de Antioquia, inquietam o poder que decide deportá-lo para as margens do Mar Negro, nos confins orientais do Império. Longo percurso a pé, extenuante. Em Comana prepara-se para morrer, veste seus paramentos brancos, comunga, reza pelos presentes e entrega o espírito dizendo: “Glória a Deus por tudo”.
Fonte: livro “Fontes”, de Olivier Clément (Ed. Subiaco), p. 331