Deus é Pai a quem podemos dirigir-nos com confiança, dóceis como crianças pequenas.
O Espírito Santo, que em cada época nos dá o remédio que mais necessitamos, deu-nos, no século passado, Santa Teresinha do Menino Jesus, para nos recordar dessa verdade. Ela mesma não hesitou em chamar a Deus de seu “Papai querido”. A simplicidade e a confiança lhe permitiram ser tão atrevida para com Deus, usando aquele “elevador” que com um único ato de confiança lhe permitiu alcançar as alturas de santidade, isto é, a união com Deus Pai. Seu pequeno caminho segue sendo hoje a direção mais acertada para retirar-nos do marasmo de medo e da desesperança na qual vive submergida uma grande parte da humanidade. Em verdade, nossa vida na terra, por difíceis que sejam os tempos, consiste em voltar a ser como as crianças.
Lembremo-nos da conversa de Jesus com Nicodemos: “Em verdade, em verdade, te digo: quem não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus” (Cf. Jo 3, 3-6). Isto significa que a nossa vida deve consistir num crescimento na atitude da confiança. Viver como cristão significa crescer na confiança, caminhar em direção à santidade, até o regresso à casa do Pai.
Deus, em todo momento da nossa vida, através dos acontecimentos, em nosso coração não cessa de nos perguntar: “Confias em Mim? Tens, para Comigo, a confiança e a simplicidade própria da criança?”.
Uma vida assim foi a de São João Paulo II, que vivendo toda a sua vida nas mãos da Mãe de Deus foi descobrindo cada vez mais a divina misericórdia, antídoto da desconfiança semeada pelo pecado original, até chegar ao final do seu caminho, quando pode dizer como último testamento, que deixou para todos nós: “Deixe-me partir para a casa do Pai”.
Mas hoje, uma grande parte da humanidade sofre submergida em uma crise de esperança. Vemos como o nível do mal é cada vez maior, a hostilidade nas relações humanas aumenta e a desconfiança entre as pessoas está na agenda do dia. Para sair desse labirinto e poder ajudar outros a encontrar o caminho que pode levar-nos ao fim do túnel é importante compreender onde está a raiz do problema.
Quando analisamos como surge o mal no homem, damo-nos conta de que os fundamentos do mal estão na falta de confiança, que nos impede de ser como uma criança em Deus. Assim foi desde o início da história da humanidade, quando o primeiro casal foi submetido à prova da fé.
No início da história da humanidade, a confiança do homem foi posta à prova. Foi como se Deus perguntasse ao homem: “confias em mim? És simples comigo e confiante como uma criança?”. O texto bíblico nos diz claramente que o homem foi atacado por satanás precisamente nesse sentido. Satanás não tratou de convencer o primeiro casal de que deviam agir mal pura e simplesmente, que deviam pecar. O que ele fez foi semear a desconfiança (cf. Gn. 3,1-6). Ele fez isso de uma maneira perfeita do ponto de vista psicológico, como somente ele sabe fazer. Tratou de convencer o primeiro casal de que em Deus não havia amor, não havia sinceridade, não havia verdade.
Onde, portanto, podemos buscar as fontes das atitudes de desconfiança? Por que o homem com tanta frequência se mostra desconfiado, buscando ou inclusive mendigando o amor? A resposta, podemos encontrá-la em nosso coração, onde uma vez se enraizou o primeiro “medo”, que produziu o pecado original.
Em que consiste esse medo inicial? Na falta de fé no verdadeiro amor. Trata-se da ferida da desconfiança e da falta de fé que tem suas raízes na “primeira desobediência” de nossos primeiros pais. Neste contexto, vale a pena recordar as palavras do Catecismo da Igreja Católica: “o homem, tentado pelo diabo, deixou morrer em seu coração a confiança em seu Criador (cf. Gn. 3,1-11) e, abusando de sua liberdade, desobedeceu ao mandamento de Deus. Foi nisto que consistiu o primeiro pecado do homem (cf. Rm 5, 19). Todo pecado, daí em diante, será uma desobediência a Deus e uma falta de confiança na sua bondade” (CIC 397).
Xavier Bordas, para a Revista Divina Misericórdia – Ed. 051.