Onde e quando um homem sofre, aí mesmo surge a necessidade de um próximo. O sofrimento maior é o da dor que se sente não havendo com quem a partilhar. A solidão é uma deficiência no ser, não há eu sem nós. Não há individualidade sem comunidade. O fim de cada ser humano é o amor, um compromisso em que se realiza o eu em nós.
O outro não deve nunca ser um instrumento que eu utilizo com vista a alcançar um qualquer outro fim. Ninguém é uma coisa. O outro nunca é meu. É um eu. Um outro eu. Faz parte do mundo em que eu só sou se ele for.
Só a partilha combate a pobreza
São os gestos que nos definem… mas também o silêncio entre eles.
A nossa sociedade tem se construído em torno do egoísmo. Consome-se no sentido de comprar, usar e descartar. Para longe. A maior miséria do nosso mundo é que algumas pessoas são, para nós, insignificantes. Estão fora do nosso mundo. Descartados. Excluídos. Estranho mundo este, onde ser explorado é, ainda assim, algo de bom, pois significa que ainda se faz parte dos visíveis.
Se, em alguns casos, a riqueza é justa e a pobreza é fruto de desleixo, é também verdade que onde abundam a riqueza e a pobreza, aí falhou a comunidade. Há uma razão simples para que os pobres sejam pobres. E não é sobre-humana. A miséria de uns é um sinal concreto de que a riqueza de outros pode ser uma violência. Porque têm o que não usam. Porque possuem como supérfluo o que para outros seria essencial.
Isolam-se, excluem o outro. Atiram-no para longe, onde não o possam ver nem ouvir. Chegam a temer um contágio qualquer. Desconhecem que onde os ricos têm a ansiedade, têm os pobres a esperança. Não sabem que há na pobreza uma alegria autêntica, que deriva de uma liberdade imensa. Mas este é um mistério absoluto para quem nunca esteve privado de quase tudo. Hoje, onde escasseiam o dinheiro, a tecnologia e as armas, abundam a humanidade, a entreajuda e a espiritualidade. Muitas vezes o ter encobre o ser.
A grandeza de cada um de nós só se descobre quando somos capazes de dar o que temos ao que somos.
Ser pobre é, ainda assim, ter alguma coisa, mas ter falta do que é essencial. A pobreza só atinge o espírito no caso daqueles que julgam que os bens materiais são o que mais importa.
É da maior importância que consigamos trazer os que estão à margem para perto do centro. Para junto de todos. Onde sejamos capazes de ser quem somos, todos. O meu próximo é o meu vizinho, que pode ter sido forasteiro, mas que agora já não o pode ser mais. No espaço e no tempo. Está ali, comigo e conosco… meu irmão. Sou eu, ali. Nós.
Quantas vezes foi o outro que se aproximou de mim quando eu estava abandonado ao sofrimento? Quantas vezes, depois, partiu quando fiquei bem sem nunca cobrar nada? Quantas vezes fui eu capaz de fazer o mesmo?
Quantas vezes esqueço o bem que me fizeram porque prefiro guardar o mal que me causaram?
Amar o outro como a mim mesmo é colocar no centro o amor que me atrai a mim e ao outro. Amar é criar algo maior do que eu. Um nós. Amar não é andar atrás de Deus. É tê-Lo atrás de nós, contente comigo, contente com outro, feliz conosco.
por: José Luis Nunes Martins
ilustração: Carlos Ribeiro
fonte: IMissio