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Estar sob a luz dos olhos de Jesus é colocar-se inteiramente disponível para que Ele reconstrua a capacidade do coração em amar a si e seus semelhantes

 

 

É impressionante observar o quanto o ser humano pode colocar de peso naquilo que é negativo na vida e naquilo que é negativo no irmão de caminhada. É uma atitude que prende os pensamentos do homem fazendo com que ele fira a si mesmo e aos que estão a sua volta. Isto ocorre porque muitos carregam feridas mal curadas ao longo do tempo, vivem num estado de cativeiro de suas próprias fraquezas e promovem um sofrimento inócuo¹ de pensamentos tortuosamente recorrentes.

Mas como controlar os pensamentos se estes são muitas vezes conduzidos pelo que o coração sente?

Um bom começo é olhar com carinho para dentro de si, pois nosso Senhor Jesus refere-se ao coração como o centro da vida do homem (cf. Mt 12,34b, Mt 13,52). O conhecimento de si mesmo é um passo rumo ao alívio das feridas provocadas pelas fraquezas que todos carregam. E as carregamos pelo fato de sermos seres humanos, e por isso, fracos e imperfeitos.

“Toda perfeição, nesta vida, é misturada de imperfeição; como as luzes são mescladas de sombras. O humilde conhecimento de você mesmo é um caminho mais certo para ir a Deus (…)”, (KEMPIS, 2010, p.27)2.

Olhar para estas fraquezas e feridas não é nada fácil, e assumi-las (exemplos: inveja, ira, vingança, etc.) é ainda mais difícil. Mas a verbalização de cada uma delas no momento da oração e tê-las presente diante dos próprios olhos é fundamental.

O fato de assumir as fraquezas, não é para comunicá-las a Deus que, obviamente em Sua onipotência, sabe de todas as coisas, mas para que a pessoa reconheça-se pequeno e necessitado de ajuda, deixando assim de ser escravo de suas dores.

Jesus não coloca condições em Seu amor para com a criatura humana, Ele apenas olha a pessoa e, antes de qualquer coisa, simplesmente a ama. É neste amor que o ser humano pode mergulhar todas as fraquezas do coração. Somente a compaixão infinita de Jesus, toma em si as dores de nossas enfermidades.

Reconhecer-se sob a luz do próprio olhar para pedir ajuda a Quem verdadeiramente pode ajudar – Jesus Cristo: “É Ele quem cura todas as suas feridas” (Sl 102, 3).

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Temos a graça do sacramento da Confissão, e muitas Pastorais na Igreja buscam oferecer auxilio àqueles que mais necessitam de escuta e aconselhamento. Ainda que o remédio seja muitas vezes de gosto difícil e de efeitos demorados.

Uma vez reconhecido como dependente da ação de Deus e necessitado de paciência, a pessoa também reconhecerá que o próximo demanda de paciência, e de que não se deve dar tanto peso naquilo que é negativo no irmão de caminhada, “(…) julgamos as coisas segundo a inclinação do nosso coração, porque o amor próprio altera facilmente em nós o verdadeiro juízo delas. (…) Se não consegue ser o que deseja, como poderá transformar os outros segundo seus desejos? Desejamos que os outros sejam perfeitos, e [sozinhos] não somos capazes de corrigir nossos próprios defeitos” (KEMPIS, 2010, p.61, p.67)3.

Um Olhar que cura

Abrir o coração com suas feridas a Cristo é como tirar uma pedra que ficou acima da terra por muito tempo, existem alguns vermes que se proliferam pela falta de luz e a terra tem ares sombrios. É desconfortável, existe dor e lágrimas, por isso nada resta a não ser contemplar o olhar de Cristo na Cruz.

É Ele que está lá abrindo a possibilidade da cura através do amor sem limites. Neste sentido, as palavras de São João Paulo II remetem a uma certeza infalível da fé:

“A cruz é como um toque do amor eterno nas feridas mais dolorosas da existência terrena do homem” (SÃO JOÃO PAULO II, 2015, 44)4.

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É desejo de Jesus, a reconstrução do coração de cada ser humano para a realização de uma vida plena. O Seu amor é a única força capaz de elevar a condição humana à verdade de sua identidade, a de filhos de Deus (1Jo 3,2). Estar sob a luz dos olhos de Jesus, é colocar-se inteiramente disponível para que Ele reconstrua a capacidade do coração em amar a si e seus semelhantes, pois “Deus quer que tudo no homem seja ordenado pelo amor e para o amor” (SALES , 1955, p. 44)5.

Em tudo isto, existe a preponderância da alegria, esperança e confiança.

Da alegria, pois, não há coisa melhor do que saber-se totalmente amado por Jesus, e de que ainda que existam elementos adversos e dificultosos ao longo da reconstrução do coração, tudo é para a promoção de um melhor viver.

Quanto à esperança, ela remete à certeza de que este melhor viver se fará mais cedo ou mais tarde, e tanto quanto mais perfeito no tempo do Senhor.

E, por fim, a confiança em Cristo, pois o “olhar da misericórdia divina fecunda a alma com variadas flores de virtude, assim como o sol torna a terra fértil, para produzir os diversos tipos de fruto: alcança-se este efeito pela inquebrantável confiança que leva o homem a entregar-se totalmente a Deus e a confiar inteiramente na superabundância de sua misericórdia (…)” (SANTA GERTRUDES , 2012, p.50)6.

 

Que a luz do olhar de Jesus resplandeça nas nossas vidas e ações!

 

 

Tayomara Mateus para a Revista Divina Misericórdia

 


 

Referência

¹ Um sofrimento que não promove amadurecimento e crescimento, apenas mantém a pessoa recorrente aos seus vícios de condutas inadequadas.

² KEMPIS, Tomás. Imitação de Cristo. São Paulo: Ed. Ave Maria, 2010 (Obs: Texto latino atribuído a Tomás Kempis – Livro I, capítulo III, parágrafo 4).

³ KEMPIS, Tomás. Imitação de Cristo. São Paulo: Ed. Ave Maria, 2010.

4 SÃO JOÃO PAULO II. Dives In Misericórdia. Curitiba: Editora Apostolado da Divina Misericórdia, 2015.

5 SALES, São Francisco de. Tratado do Amor de Deus. 2 ed. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1955.

6 HELFTA, Gertrudes. Mensagem da Misericórdia Divina. Juiz de Fora: Ed Subiaco, 2012.