No dia 26 de abril de 1500 foi celebrada a Primeira Missa no Brasil. Era um domingo. O fato em si é digno de lembrança e celebração. Mas há algo mais que se acrescenta. Aquele dia foi o primeiro domingo após a Páscoa. A tão importante Oitava da Páscoa na liturgia da Igreja. Entendida como o tempo da renovação, da recriação, um novo kairós de Deus para o seu povo. E tudo isso está relacionado com a Divina Misericórdia.
Na atual liturgia da Igreja a Oitava da Páscoa, ou seja, o domingo após a Páscoa, é o DOMINGO DA DIVINA MISERICÓRDIA. Uma celebração litúrgica muito requisitada por Jesus a Santa Faustina, como vemos em seu Diário em diversas passagens, entre elas esta:
“Eu desejo que haja a Festa da Misericórdia. Quero que essa Imagem, que pintarás com o pincel, seja abençoada solenemente no primeiro domingo depois da Páscoa, e esse domingo deve ser a Festa da Misericórdia” (Diário, 49).
A Igreja atendeu este pedido de Jesus por meio de Santa Faustina. Em 2002 o Papa João Paulo II declarou o segundo domingo de Páscoa oficialmente como Domingo da Divina Misericórdia. Neste ano de 2016 estamos vivendo um Jubileu extraordinário da Misericórdia, aberto por sua Santidade o Papa Francisco.
Com aquela missa fica claro que o Brasil, desde o seu início, foi consagrado à Divina Misericórdia. Claro que a Festa como tal não existia ainda no calendário da Igreja, mas, no coração de Deus ela era uma realidade, na qual participaram os primeiros portugueses que aqui chegaram e, provavelmente, alguns índios.
Aliás, vale a pena ler alguns trechos da nossa primeira carta, onde fica explícita a devoção destas pessoas:
“Ao domingo de Pascoela pela manhã, determinou o Capitão ir ouvir missa e sermão naquele ilhéu. E mandou a todos os capitães que se arranjassem nos batéis e fossem com ele. E assim foi feito. Mandou armar um pavilhão naquele ilhéu, e dentro levantar um altar mui bem arranjado. E ali com todos nós outros fez dizer missa, a qual disse o padre frei Henrique, em voz entoada, e oficiada com aquela mesma voz pelos outros padres e sacerdotes que todos assistiram, a qual missa, segundo meu parecer, foi ouvida por todos com muito prazer e devoção.
Ali estava com o Capitão a bandeira de Cristo, com que saíra de Belém, a qual esteve sempre bem alta, da parte do Evangelho. Acabada a missa, desvestiu-se o padre e subiu a uma cadeira alta; e nós todos lançados por essa areia. E pregou uma solene e proveitosa pregação, da história evangélica; e no fim tratou da nossa vida, e do achamento desta terra, referindo-se à Cruz, sob cuja obediência viemos, que veio muito a propósito, e fez muita devoção. Enquanto assistimos à missa e ao sermão, estaria na praia outra tanta gente, pouco mais ou menos, como a de ontem, com seus arcos e setas, e andava folgando (…)
Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, segundo as aparências. E, portanto, se os degredados que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa tenção de Vossa Alteza, se farão cristãos e hão de crer na nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque certamente esta gente é boa e de bela simplicidade. E imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que lhe quiserem dar, uma vez que Nosso Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens bons. E o Ele nos para aqui trazer creio que não foi sem causa. E, portanto, Vossa Alteza, pois tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da salvação deles. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim!”
Não somos ingênuos e sabemos que houve muita intenção de exploração do Brasil, das suas riquezas; sabemos que os índios muito sofreram. Mas, pela carta, fica claro também que houve temor a Deus e desejo de servi-Lo. Os europeus trouxeram muitas coisas boas consigo, entre ela a fé, nosso maior legado. A história do povo de Deus é sempre marcada pela graça divina e pelas vicissitudes humanas. Por homens sórdidos, mas também por santos e outros não tão santos, mas com temor no coração. Somos um povo de fé que forma uma nação cristã. Se queremos algo melhor para nós não podemos nos afastar desta nossa vocação. Não permitamos que setores ideológicos e materialistas nos façam perder nossa herança.
Neste tempo de dilacerante crise moral e até mesmo de fé que se abate sobre nosso povo, devemos olhar para nossa história. Nela vemos muitos erros, com certeza, mas vemos também desejo de acerto e, acima de tudo, o agir da Providência Divina. Somos a Terra de Santa Cruz, marcados desde o início pela Misericórdia Divina e, portanto, com o direito e o dever de a esta mesma misericórdia erguermos o nosso clamor por este país.
Fonte: Acorda Terra de Santa Cruz